sábado, 28 de abril de 2007

A visita do papa

A visita do papa

Os brasileiros, especialmente os católicos, esperam com grande expectativa e esperança a visita do papa Bento 16 ao Brasil no próximo mês, de 9 a 13 de maio. Os preparativos têm a participação do clero, do Vaticano, de leigos e de autoridades, e demonstram um apreço que Sua Santidade soube granjear em seu curto pontificado. Trata-se da visita daquele que sucede ao próprio Cristo na condução do barco da Igreja, de um chefe de Estado que, como seu antecessor, o papa João Paulo 2º, viaja em missão de paz e quer difundir valores que precisam ser preservados na sociedade moderna, hoje tão ameaçada e conturbada pelos ódios, as incompreensões, os preconceitos e as guerras.

Segundo a experiente diplomata na Santa Sé, Vera Machado, não haverá temas proibidos. E um tema que deverá ser abordado diz respeito aos valores da família e da preservação da vida. Nessas mensagens, portanto, a questão do aborto, cujo debate cresce dentro do governo, poderá estar incluída. A visita faz parte de um reforço dos trabalhos da Igreja pela evangelização na região. “A Igreja quer estar presente nos bolsões de pobreza, nas periferias, inclusive para evitar que busquem alternativas espirituais”. E não esconde a preocupação com a proliferação de igrejas evangélicas no país. O papa, apesar de tratar de temas políticos, virá ao Brasil com metas pastorais bem claras. “A questão da pobreza e da luta para erradicá-la é uma preocupação permanente para Bento 16, assim como os direitos humanos”. A escolha por nosso país revela que o Vaticano vê, de fato, o país como uma prioridade no esforço da Igreja pela evangelização. O resultado da Quinta Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe no Brasil, a se realizar em Aparecida do Norte, será “vitrine” para os demais países.

A canonização do beato frei Galvão, primeiro santo brasileiro, constituirá o ponto alto de sua visita, e deverá reunir em São Paulo uma multidão de fiéis devotos do frade humilde, criador das famosas “pílulas evangélicas”.

Logo que assumiu seu pontificado, Bento 16 enfrentou oposições e preconceitos que o situavam como conservador tradicional e radical. Antes de ser papa, ele trabalhou ao lado de João Paulo 2º como prefeito da Congregação da Fé, cuja função era zelar pela ortodoxia católica. Nessa função e de maneira coerente com a doutrina da Igreja, ele silenciou os religiosos progressistas brasileiros, Leonardo Boff e o bispo emérito de S. Félix do Araguaia, dom Pedro Casaldáliga, depois de um longo processo de escuta e averiguação quanto às posturas que contradiziam o sentido do verdadeiro cristianismo, especialmente nos quesitos de fidelidade, obediência e promoção da paz.

Agradar a gregos e troianos é a linha adotada pelos omissos e largamente utilizada pelos políticos de má-fé. A Igreja não segue esta linha e não poderá concordar nunca com os desvios da sã doutrina e das leis contrárias aos princípios sábios e eternos do Evangelho.

Nossas mudanças culturais, contudo, estão fora das dimensões e das referências quanto ao que é certo ou errado. As pessoas, sob a alegação de liberdade e de autonomia querem fazer o que bem entendem, abandonando os parâmetros de comportamento ético e passando para o extremo oposto de repudiar tudo quanto interfere em sua liberdade, muitas vezes já esfacelada e transformada em libertinagem e escravidão do pecado. Todo aquele, portanto, que representa uma ameaça ao seu modo de viver, contrariando seus propósitos, será sempre atacado e vitimado pelas distorções e as injustiças. Em seu tempo, Cristo se colocou ao lado da verdade e dos sem vez nem voz contra o autoritarismo, a injustiça e o farisaísmo de um sistema viciado e carente de valores. Hoje, igualmente, Ele também seria de novo condenado e crucificado.

Sua primeira encíclica, Deus Caritas Est, publicada logo após a investidura pontificia, cujo tema Amor, Eros e Ágape, hoje tão explorado e deturpado, nos traz uma reflexão profunda e surpreendente, abriu- lhe o prestígio e a consideração dos mais céticos. Trata-se de um homem de Deus, firme e coerente em suas deliberações e atitudes, amplamente afinadas com suas convicções quanto à enorme responsabilidade pastoral que lhe pesa sobre os ombros, na atual conjuntura do mundo. Um mundo, hoje, dividido entre uma sociedade que crê em Deus e outra que não crê, esta última que tudo se permite, segundo o famoso personagem de Dostoievsky em “Os irmãos Karamazov”: “Se Deus não existe, tudo é permitido”. Uma sociedade de absurdos paradoxos que se movimenta estrepitosamente na defesa dos ovos de tartaruga, dos fetos das baleias e dos ursos pandas ameaçados de extinção, porém, não se compadece dos fetos humanos indefesos, quando perfila a favor do aborto sem limites. Este é o retrato de uma divisão cruel e difícil que o chefe espiritual da Igreja tem diante de seus olhos. Como seu antecessor, ele percebe claramente uma situação de conflito, num mundo doente e urgentemente necessitado de mudar seus rumos. Na condução da Igreja, ele vem demonstrando ser um homem de paz, reservado e pronto ao diálogo, aquele que sabe ouvir e falar por último, segundo os que privam de seu convívio, além de possuir a necessária sabedoria do alto, acompanhada de enorme erudição. Os jovens que constituem o “termômetro” de aceitação e acolhida, vêm demonstrando por ele uma enorme empatia em todas as ocasiões de contato, e este é um dado muito significativo.

Peçamos a Deus por essa visita. Que o Brasil inteiro se beneficie e aprenda suas lições, especialmente as famílias, os jovens e os governantes, tão necessitados da plenificação espiritual que os arranque do vazio existencial em que estão metidos.

Myria Machado Botelho é escritora

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