segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Chocolate ganha mais gordura e indústria economiza

A indústria de chocolates no Brasil resolveu aderir à estratégia do "põe mais água no feijão". Para reduzir custos - só o cacau teve alta de 45% neste ano, até ontem - os fabricantes aumentam o teor de gordura na formulação das guloseimas.

Por definição do Ministério da Agricultura, o chocolate produzido e comercializado no Brasil deve ter, no máximo, 5% de gordura vegetal e 25% de cacau, no mínimo. Esses percentuais foram definidos em setembro 2003, depois de mais de um ano de pressão da indústria, representada pela Associação Brasileira da Indústria de Chocolate, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), que reúne as três maiores marca do mercado - Nestlé, Garoto e Kraft Foods (Lacta). O objetivo do lobby, na época, era reduzir de 32% para 28% o limite mínimo de cacau para os chocolate. Conseguiram chegar a 25%.

Em 2002, o que motivou a campanha por menos cacau era a recessão econômica que freava o consumo. O mercado brasileiro de chocolates, naquele ano, tinha um consumo interno máximo 125 mil toneladas. Hoje, a previsão é fechar 2008 com 136 mil toneladas, o mesmo patamar de 2007. O que assusta a indústria agora é a alta das commodities.

"Do início do ano para cá o preço da tonelada do cacau passou de US$ 2,2 mil para US$ 2,8 mil, chegando a um pico de US$ 3,2 mil em junho", diz Thomas Hartmann, produtor e um dos principais consultores do segmento cacaueiro. A causa da alta, segundo ele, é especulativa. "São os grandes fundos de investimentos que deixaram de aplicar em ativos financeiros para aumentar seu volume de investimentos em commodities, dentre elas o cacau", explica.

Para fugir do cacau mais caro, empresas como a Nestlé, anunciaram mudanças na fórmula de seus chocolates. No caso da multinacional suíça, toda linha de tabletes de 100 a 200 gramas mudou de fórmula. A Nestlé, por meio de sua assessoria de imprensa, nega que a causa seja reduzir custos.

Mas para o mestre chocolateiro Arlindo Pinheiro, a mudança tem sim a ver com o barateamento da produção. "Quando a empresa tira o leite 'in natura' e a lactose da fórmula de um chocolate e os substitui por leite em pó integral, soro de leite e gordura anidra de leite, está deixando o produto com menos cacau e mais gordura. É como se diluísse o chocolate", afirma ele, comparando os ingredientes de um produto da marca antes e depois da mudança. "Se o chocolate tem mais leite, necessariamente fica com menos cacau", endossa o consultor Hartmann.

Mas não é só mais leite que as novas fórmulas têm. A indústria achou uma nova maneira de interpretar a norma do nível máximo de 5% de gordura vegetal nos tabletes: a adição da gordura anidra de leite. O ingrediente, que antes não era usado no preparo das guloseimas, agora soma-se à gordura vegetal. "A gordura anidra de leite nada mais é que manteiga desidratada", explica o mestre chocolateiro.

Os fabricantes de chocolate não revelam quanto o custo de produção cai com as alterações. Mas a Abicab confirma que elas acontecem. "Cada indústria acha um meio de contornar a alta do cacau", diz Mauricio Weiand, presidente da divisão de chocolates da Abicab e gerente de exportações da Florestal Alimentos, detentora da marca de chocolates Neugebauer.

A argentina Arcor, por exemplo, adotou outra estratégia. Está lançando os tabletes "Butter Toffes" em embalagens de 25 gramas e preço sugerido de R$ 1,00 por unidade. Os tabletes dessa categoria geralmente custam R$ 1,50, mas pesam mais: entre 28 e 30 gramas. "Conseguimos um preço bem competitivo sacrificando nossa margem de lucro e desenhando um produto um pouco menor", avalia o diretor de marketing de chocolates e guloseimas da Arcor, Gabriel Porciani. A empresa, que tem 5% do mercado nacional, espera com a estratégia crescer sua participação. "A alta do cacau foi agressiva demais. Não há como repassar isso para o varejo. Quer fizer, vai perder vendas", afirma.

Nenhum comentário: