Você chega a um hospital, vai até a sala do médico que vai atendê-lo e ... descobre que não é médico! Na conversa que se segue, você fica confuso:
- Bom dia senhor, qual é o seu problema – diz a pessoa que está sentada na mesinha branca, à sua frente, vestindo um uniforme de jardineiro.
- Errr ... bom dia. Bem, eu vim aqui para um consulta com um cardiologista, mas vejo que ele não está. Quando é que ele chega?
- Ora, meu amigo, que preconceito é esse – diz ele. Você não está vendo que estou fazendo o atendimento. Então? Qual é o problema. E vamos rápido porque a fila está grande!
- Ora, o problema é que meu problema não é corte de samambaia. Estou querendo tratar uma dor no peito, mas o senhor está sentado exatamente onde deveria estar o médico com que vim consultar. O senhor não é médico, pois não?
- Claro que eu não sou médico, mas sou muito amigo do Diretor do hospital, e ele me nomeou para o Departamento de Cardiologia. Sabe como é ... há anos que faço um excelente trabalho no jardim da casa dele, e como estou precisando trabalhar, ele me deu essa oportunidade para mostrar meu talento. Estou fazendo um ótimo trabalho e em breve vou poder conversar com ele sobre minha promoção para a área de Neurocirurgia. Sempre quis ser neurocirurgião, mas não tive oportunidade na vida, você entende né. Mas vamos lá. Dói onde ...?
Você se levanta meio atônito, sai do consultório e chega à rua com a certeza de que a dor no peito passou. O que dói agora é a cabeça. Onde já se viu! O cara pode ser o melhor jardineiro do mundo, mas daí a fazer ponte de safena... vai uma enorme diferença.
A pequena passagem acima serve para ilustrar situações bastante semelhantes, que passam despercebidas da grande maioria de nós, principalmente pelo fator “sempre foi assim ...”. É prática comum, na formação de um governo municipal, a elaboração de uma lista de correligionários que, no momento da luta eleitoral, tiveram um excelente desempenho como cabos eleitorais, apoiadores, multiplicadores, patrocinadores, etc, e que precisam ser recompensados pelo esforço, participando do staff do novo prefeito (governador, presidente da república). Não há necessidade de apresentação de credenciais objetivas, mas apenas a participação ativa no grupo vencedor, para estabelecer a contratação para um cargo de confiança – ou nem tanto – no corpo funcional, exercendo muitas vezes funções estratégicas e fundamentais para o bom andamento da administração pública.
Ora, se numa empresa privada (de qualquer porte) o processo de seleção está cada vez mais rigoroso, com o candidato passando pelo crivo da análise de currículo, entrevista preliminar, dinâmica de grupo, prova escrita, entrevista final para então poder ser contratado ... porque para escolher secretários municipais as coisas são tão mais fáceis? O próprio município, no momento da contratação de funcionários, realiza exames rigorosos para a seleção dos futuros colaboradores, porque os “chefes” passam pela janela?
Dizer que isso é um sinal de autonomia do Estado, que qualquer coisa em contrário seria antidemocrática é ignorar os resultados que essa prática reflete em várias áreas da administração pública, e queremos analisar isso do ponto de vista do Município, que é a nossa casa, o ponto de referência política mais próximo que dispomos, enquanto eleitores e cidadãos.
Cito o caso das Secretarias de Turismo, que no mais das vezes são relegados a um segundo plano, principalmente porque o setor ainda não teve a consideração das lideranças políticas, mesmo em sendo o aquele mais cresce no mundo, proporcionando condições de geração de emprego e renda para todas as classes sociais. Analisando o perfil de diversas prefeituras, vemos que a Secretaria de Turismo está sempre associada a alguma outra atividade ou até nem existe no organograma. Pedem-se verbas para o Turismo, fala-se da necessidade de preparar mão de obra para a atividade, sabe-se que essa é a saída mais rápida e apropriada para as prefeituras de pequenas cidades, mas na hora de “contratar” um gestor, repete-se o modelo que privilegia o descaso. E quando alocado à função, esse gestor dispõe de uma fração de orçamento municipal mínima, de um poder de atuação limitado ou de uma equipe desmotivada, mantida numa sala sem estrutura. É quase como pedir que ninguém faça nada pelo turismo, mantendo apenas as aparências para o caso de aparecer alguma coisa interessante no setor.
Esse, repito, não é um problema localizado, mas sim generalizado. Em maior ou menos escala, com maior ou menor estrutura, com mais ou menos competência dos envolvidos, a situação se repete seja lá para onde estivermos olhando.
O nosso Vale Histórico, esse imenso rincão de 7 mil kilômetros quadrados, com potenciais formidáveis, resquícios de épocas áureas, com quase 600 mil habitantes merece um cuidado maior e uma atenção redobrada. Hoje, apenas a cidade de Aparecida conta com uma visitação anual de 8,5 milhões de pessoas. A região como um todo deve ter uma visitação que ultrapassa, hoje, os 12 milhões de turistas/ano, e esse número deve ultrapassar rapidamente a marca dos 15 milhões até 2010. Em contrapartida, vemos que pouco mais de 8% de nossa população ainda se encontra no campo, tendo em conta o êxodo que vem se agravando ano a ano pela redução de oportunidades. A maioria esmagadora vai se comprimindo em cidades que, pela falta de estrutura, acabam empurrando aqueles que dispõe de ânimo e energia para as áreas com maior PIB, o que acarreta criação de bairros periféricos, falta de estrutura básica e, finalmente, violência urbana.
A par dos esforços feitos pela iniciativa privada, que quer encontrar campo para florescer, desenvolvendo a chamada “indústria do turismo” para a nossa região, é necessário que o poder público municipal esteja atento a isso: valorize a Secretaria de Turismo de seu município em todos os sentidos. Buscar competência técnica, criar infraestrutura, desenvolver o tema de sua cidade e mesmo a marca de seu município são tarefas que o administrador público precisa ter em mente, hoje mais do que nunca, para poder conduzir um processo de crescimento a partir do interesse do mercado para as maravilhas que existem aqui. Turismo não é feito apenas por empresários. Excelência em Turismo é um esforço conjugado para atingir o coração daqueles que, em contato com um produto qualificado, deslocam-se para viver um momento mágico.
Turismo, portanto, começa em casa. Na nossa casa.
Ernesto Elache
Presidente
Nelson Marques
Diretor de Projetos
Sindicato de Hotéis Bares, Restaurantes e Similares de Aparecida e Vale Histórico
SINHORES
16/10/2007
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